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No Brasil, os jornalistas são livres para escrever e publicar. Num país oficialmente livre das amarras da censura de imprensa, os interessados em impedir que uma informação venha a público encontraram, no entanto, outras maneiras de fazê-lo.
Em Avaré, alguns jornalistas vem sofrendo represálias e intimidações por parte dos agentes públicos da cidade. Cida Kock, do Jornal in foco, Wilson Ogunhê e Marcelo Ribeiro, bem como o influenciador digital, Paulo Proença, vem sendo alvos de ações judiciais ou de representações na Polícia Civil.
Marcelo Ribeiro, que recentemente foi dispensado da Rádio Cidadania devido a pressão de agentes políticos, recebeu dois processos da vereadora Carla Flores, sendo um na esfera civil e outro no criminal. Nas denúncias, Flores alegou que o radialista teria proferidos palavras como “joselete” e “maçaneta” e que isso teria difamado ela.
Porém, tanto na esfera civil como na criminal, o judiciário avareenses julgou as ações improcedentes.
Na sentença, Juiz Jair Antônio Pena Júnior destacou que o intuito da vereadora Carla Flores em impetrar a ação contra o radialista, foi com a finalidade de retaliação. “…Visto que é evidente a finalidade de retaliação e o intuito político da Querelante ao se valer da presente demanda penal, pois pretende intimidar a imprensa local, fazendo-a temerosa quanto ao exercício de seu mister – o que não se pode admitir”.
Ainda para o juiz, a vereadora Carla Flores “deve sim explicações à população de todos os seus atos e omissões, podendo ter sua conduta funcional contestada, consoante determinam os princípios da legalidade, moralidade e publicidade”.
Recentemente, a secretária de Cultura, Isabel Cardoso, também fez uma representação contra o radialista na delegacia de polícia alegando crime de homofobia pelo profissional ter colocado uma música folclórica de carnaval, denominada “Maria Sapatão”. O radialista lamentou o fato e afirmou que essa seria mais uma tentativa de retaliação e de intimidação, já que as críticas foram proferidas sobre a cobrança para o cancelamento do Carnaval no município, diante da alta dos casos de coronavírus e que nada teriam a ver com a sexualidade da secretária. Ele afirmou, ainda, que a denúncia é totalmente infundada e descabida.
A jornalista Cida Kock, do in foco, também foi alvo de uma ação judicial. Na denúncia, a diretora da Câmara Municipal, Ádria Luzia Ribeiro de Paula, alegou que a jornalista, por mais de uma vez, publicou o nome e os vencimentos dela, bem como que ela ocupa um cargo comissionado no legislativo. A ação também foi julgada improcedente.
Em sua sentença, o juiz Jair Antônio Pena Júnior destacou que as informações sobre o valor dos salários “constam dos sítios dos órgãos a que pertencem os servidores, sendo, pois, de domínio público, sendo autorizada a utilização das ditas informações, desde que não de modo abusivo” e que “a publicação pela parte requerida dos dados remuneratórios da autora não desbordam do uso regular das informações em questão”.
O jornalista Wilson Ogunhê também foi alvo de ações judiciais, tanto do prefeito de Avaré, Jô Silvestre, como do presidente da Câmara Municipal, vereador Flávio Zandoná, que também fez representações na Polícia Civil.
O influenciador digital, Paulo Proença, constantemente vem sendo alvo de boletins de ocorrência. Em 2021, ele chegou ter o computador e seu celular apreendidos para averiguação, porém, a investigação não resultou em nenhuma denúncia contra ele.
Outros jornalistas já foram alvos de ações judiciais movidas por políticos ou agentes públicos do município.
ASSÉDIO JUDICIAL – Em dezembro de 2021, a Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji) apresentou ao Supremo Tribunal Federal (STF) uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) requerendo maior proteção para casos de assédio judicial contra jornalistas, prática coordenada de distribuição pulverizada de processos contra um mesmo alvo, com o intuito de intimidá-los. A ação tem como objetivo impedir que os Juizados Especiais Cíveis (JECs) e a Justiça sejam utilizados para perseguir jornalistas e comunicadores.
Para a Abraji, o assédio judicial contra jornalistas seria uma nova forma de censura. “Casos como estes apontam para a urgência de uma ampla discussão envolvendo poder judiciário, profissionais de imprensa e sociedade, sobre liberdade de expressão e de opinião no país”.
Em janeiro, a ministra Rosa Weber, relatora da ADI, remeteu a ação da Abraji diretamente ao Plenário e pediu informações ao presidente da República, ao Senado e à Câmara Federal.
As 116 sentenças favoráveis à repórter demonstraram, naquela ocasião, que o Poder Judiciário considerou inaceitável ser instrumentalizado. Mas desde então nada mudou. “Outros casos de assédio foram surgindo, e também tiveram que ser combatidos individualmente, com grande desgaste para comunicadores e jornalistas”, diz Gasparian.
Por isso a Abraji decidiu propor a ação para tentar brecar, no início, os episódios de assédio.
O Jornalismo é um dos pilares das sociedades democráticas e não há Jornalismo sem jornalistas. Portanto, é responsabilidade de todos combater ações de quem quer que seja, para a disseminação de uma cultura da violência contra jornalistas.